Quando se fala em moda
evangélica é difícil, para os que não vivem o dia a dia da igreja, fugir à
mente a imagem da jovem escondida atrás de uma longa saia feita num tecido
pouco trabalhado, de rosto limpo de qualquer maquiagem e cabelo longo preso em
uma trança. Por anos, a imagem estereotipada da jovem evangélica tem sido
pautada pela mulher submissa, escondida e pouco preocupada com questões de
estilo. Mas os limites deste padrão vêm sendo alterados, principalmente pela
presença cada vez mais forte de jovens dentro das igrejas.
A presença de jovens
evangélicos na sociedade brasileira aumentou de 17,72% para 21,59% entre 2003 e
2009, um crescimento considerável quando comparado ao aumento do evangélico no
Brasil como um todo, de 16,2% para 17,9% no mesmo período, de acordo com a
pesquisa “O Novo Mapa das Religiões” publicada em agosto de 2011 pelo
economista Marcelo Neri, da Fundação Getúlio Vargas.
Embora não acredite que seja
uma estratégia pensada por parte das igrejas neo pentecostais (religiões evangélicas surgidas a partir dos anos 1970), o pastor Felipe Parente, da
Igreja Bola de Neve, concorda que a flexibilidade em certas questões é um atrativo
para o jovem se juntar às religiões
evangélicas. "Muito do que o jovem quer e acredita está expresso na identidade de suas roupas e
ele acaba indo para uma igreja em que se identifica com os outros membros,
mesmo que essa identificação seja, a princípio, por meio das roupas", diz.
Exatamente por ser uma jovem
comum e não querer ser rotulada apenas como evangélica é que a estudante
Juliana Frade, 22, escolheu uma igreja um pouco mais liberal quando resolveu se
converter. "Nossa principal regra é o bom senso. Sou básica e quase não
tenho restrições a nenhum tipo de
roupa. Mas, dentro da igreja, acho que certas coisas não cabem, como batom
vermelho", explica a jovem que frequenta a Igreja Renascer há dois anos e
também é apaixonada por moda. Por conta desta paixão misturada a uma moral
cristã, Juliana se nega a usar algumas tendências. "Não uso nada que deixe
meu corpo exposto, como minissaia. Não acho bonito. Gosto de coisas que não
deixam a mulher vulgar", diz.
Arquivo Pessoal
A estudante Juliana Frade,
22, que frequenta a Igreja Renascer há dois anos
Em seu guarda-roupa, por
exemplo, não entram as transparências do cetim e da seda. Mas e renda, como
fica? "Só com alguma coisa por baixo", afirma. Para algumas
tendências, a jovem dá seu 'jeitinho', como é o caso do shorts. "Quando
está muito quente, não aguento e acabo usando comprimentos mais curtos. Mas,
neste caso, sempre opto por uma blusa fechada, com manga 3/4", indica.
Lição de moda aprendida para qualquer que seja a religião. E, se em alguns
casos é possível ajustar a doutrina à moda do dia a dia, em outros, a fé fala
mais alto. "Costumo evitar roupas com caveira, coruja ou olho grego,
porque em muitas crenças dizem que estas imagens dão sorte e não acreditamos
nisso", diz.
O jovem se expressar por
meio das roupas não é uma novidade. "A moda jovem vai fazer parte da
sociedade a partir dos anos 1960, com aquilo que foi chamado de antimoda, uma
atitude de transgressão", explica o professor e historiador de moda João
Braga. Ainda de acordo com o acadêmico, o jovem evangélico dialoga com a moda
não apenas na forma das roupas. "É possível criar identificação com moda
por meio dos tecidos, texturas e
principalmente das cores das roupas."
Foi justamente pensando em
outras formas de identificação com moda que, há mais de 10 anos, o empresário
Valdecir de Oliveira Corsi, criou, em Cianorte, no Paraná, sua primeira marca
exclusiva de roupas femininas para mulheres evangélicas, a Marian. "Nasci
dentro de confecção e, embora por algum tempo da minha vida tenha ficado longe
de roupas, descobri minha vocação", diz ele. Evangélico, membro da
Congregação Cristã do Brasil, uma das linhas mais conservadoras, Valdecir vem
fazendo um trabalho de mapeamento das preferências da mulher evangélica.
"Ela não gosta do vestido longo, mas gosta de comprimentos na altura do
joelho. Já as meninas mais jovens, preferem roupas curtas, do tipo um palmo
acima do joelho e saias bem rodadas", diz o empresário que se recusa a
trabalhar com comprimentos míni. Outra paixão das evangélicas, segundo ele, são
as rendas. "Peças que têm detalhes rendados costumam estourar nas
vendas". No caso, o 'estouro' significa que vendeu mais de 350 peças. Para
o inverno, a aposta de Valdecir é a imitação do couro. "São as peças mais
procuradas pelas jovens".
Voltando à família Corsi: os
números vêm mostrando que o trabalho e o esforço ainda são uma boa receita
mesmo em se tratando de fazer moda para determinado nicho. Com uma cartela de
mais de mil clientes, vendendo para todo o país e apenas no atacado, além da
Marian, o empresário criou, também em 2001, a Via Caruso, marca de roupa para
mulheres evangélicas mais reservadas. E, há um ano, nasceu a Hapuk, a menina
dos olhos de Valdecir, que foca na moda para jovens evangélicas. Sob sua chefia
estão diretamente 50 funcionários, outros 100 trabalham indiretamente e, apenas
no ano passado, o faturamento das três marcas esteve na casa dos R$ 8 milhões.
Fonte: UOL
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